[Resenha] Workshop “Totentanz: a dança da morte”

10:40

por Gilmara Cruz

 Fotografia Oficial por Estela Zardo | estelaz.photo@gmail.com 

Você saberia me dizer agora o que pensaria se estivesse de frente com sua própria morte? Como se sentiria se descobrisse que hoje seria seu último dia? Sentiria medo, aflição, desespero, curiosidade?

Essas foram algumas das perguntas feitas durante o processo de reflexão no Workshop “Totentanz: a dança da morte. Este foi construído a partir do estudo da iconografia medieval sobre o Dance of Death, estilo artístico, de imagens e escritos, sobre o terror da morte, que assolava o cenário dos séculos XIV e XV na Europa. Nesses séculos houve várias manifestações sobre o medo de morrer e a aversão ao cadáver através da arte. Esse medo surgiu com a infestação da Peste Negra. O workshop buscou experimentar o amargo trazido pela ideia de morrer e refletir sobre a valorização da vida. Durante nossas vidas damos muita importância a “coisas” que somente em um momento final é que podemos repensar sobre esses valores. Enquanto dançarina e historiadora, investi na ideia de resgatar essas reflexões, angustias e sofrimentos (que todos nós sentimos em algum momento) e ressignificá-los em nós, permitindo que sentimentos como medo, tristeza e afins pudessem ser expressados através dos corpos dançantes. Penso que a Arte é Sentimento e não gosto da ideia de desprezar os sentimentos obscuros, é como se eu negasse parte de mim, a parte escura do meu ser que, juntamente com a parte “bela”, compõem o mosaico de mim, deixando-me inteira e completa.



A partir dessas reflexões, é que construo a minha dinâmica de aula dentro do estilo Dark Fusion e procuro proporcionar aos bailarinos um conhecimento melhor de si mesmo. Não fomos ensinados a lidar de forma equilibrada e harmoniosa com as nossas dores e nem com o escuro. Buscamos sempre estarmos felizes o tempo todo, embora essa seja uma ilusão. Então, durante o workshop apresentei a minha ideia de dança, mundo e arte. Trouxe o poema Charles Baudelaire (Dance Macabre) para mostrar-lhes a sua visão de morte. E assim, percebermos que as interpretações são meramente subjetivas.

A primeira parte da aula foi dedicada à apresentação da história do Dance of Death, minha visão e saber qual era a visão delas acerca do tema. Perguntei-lhes qual sentimento sentiria diante de sua própria morte.

No segundo momento, trabalhei com a desconstrução do ATS® e outros movimentos, numa estética macabra, sombria e deteriorada. Essa parte da aula foi composta pela apresentação de movimentos que eu já desconstruí, e a experimentação de desconstruções propostas pelas alunas diante da atmosfera que algumas músicas nos proporcionavam. Essa foi a parte técnica da aula.


Na terceira parte do workshop, fizemos uma meditação guiada por mim, trabalhando nossa imaginação e nos reportando para o dia final de nossas vidas e em seguida solicitei que elas dançassem o sentimento sentido em todo o trabalho. Essa atividade final foi nomeada por mim de: “Corpus frenéticus”, para fazer alusão à histeria e o tremor representados nas artes do período. Essa atividade consistiu em uma experiência vivida em sala de aula que buscou coletivamente usar e abusar de movimentos deteriorados e desconstruídos (trabalhado na segunda parte do workshop) consolidando um ritual de desespero e drama de adoecimento corporal diante da notícia da morte de cada participante. E, subitamente, como uma doença injetada no sangue, os corpos anteriormente imóveis, se levantaram para deixar seus rastros de dor e sofrimento diante da morte que lhes perseguiam sem nenhuma chance de os deixarem fugir. A atividade desejou explorar movimentações desconstruídas, deterioradas que abusem de tensões, espasmos, torções, movimentos assimétricos, retorcidos e que expressem sentimentos sem nenhuma preocupação com regras de danças ou estereótipos. O ideal era sucumbir à movimentação natural sentida no interior e expressada no exterior através do corpo, em uma espécie de transe doentio. Através dessa experiência, visou-se revisitar o próprio eu, valorizar o que realmente deve ter valor, explorar e ultrapassar limites corporais, muitas vezes, impostas por regras e padrões de dança. Objetivou o autoconhecimento, a reflexão sobre a vida/morte, a relação com o outro e com o espaço em que vivemos, e a libertação corporal na Dança. Também tentei instigar reflexões acerca de crítica social de igualdade entre as pessoas, reflexão que eu gostaria de propor dentro do cenário da Dança. Porque assim como a morte, a Arte e a Dança também não fazem distinção entre “raça”, sexo, etnia, posição social, condição financeira e afins.

Senti-me extremamente satisfeita com o resultado! Foi gratificante perceber a entrega dos corpos, a permissão das mentes, o abandono das regras... Foi incrível como a vivência trouxe sentimentos distintos daqueles que elas imaginavam sentir. Essa atividade nos traz a diferença entre representação e vivência e, enfatiza que a percepção de mundo é extremamente subjetiva.  A vivência é algo que considero importante dentro do estilo Dark. A sinceridade é fundamental! Foi inusitado ver lágrimas caírem, ver a doação daqueles corpos em movimentos estranhos, mas belos...sentir a tristeza e a dor compartilhadas, e ver a utilização do corpo de forma mais livre podendo sentir nelas o Dance of Death estampado!


Fonte: Représentations diverses de la mort (Patrick Pollefey)


Acompanhe as novidades através das nossas redes sociais!


- PERFORMANCE -



Filmagem & Edição: Max Olsen Produção Audiovisual
E-mail: maxolsen.audiovisual@gmail.com
- Fan Page: https://www.facebook.com/maxolsenpa/

You Might Also Like

0 comments